Forgotten Tales – Dark Sun - “A Cisterna Mágica” – Parte 3

Darian colocara-se na frente do escravo. “Solte sua arma, homem”. O comerciante  à sua frente estava furioso.

“Esta peste roubou-me dois litros d’água, templário! Dois litros!” Disse o homem, ainda com sua espada em riste.

“Nós vamos lidar com isto depois. Agora me obedeça! Largue a arma!” A voz de Darian tornou-se ríspida. Não gostava de falar a mesma coisa mais de uma vez. Aquele mundo era duro, e as pessoas entendiam qualquer hesitação como um sinal de fraqueza.

O homem abaixou a espada. O escravo levantou-se, com os olhos marejados. “Obrigado, senhor! Eu estava morrendo de sede! Ele me deixou dias sem uma gota qualquer!” O escravo estendeu as mãos ao templário, num gesto de gratidão.

Darian segurou sua mão. O escravo tentou retirá-la, mas o templário não o deixou. “Senhor…”, o homem olhava para ele, não entendendo o que acontecia. O templário então tomou sua espada e decepou-lhe um dos dedos. O escravo agonizou. A multidão olhava, estarrecida.

Rindo alto, o comerciante agradeceu. “Você fez muito bem, templário! Este maldito precisava mesmo de…”, antes, entretanto, que ele terminasse suas palavras, Darian decapitou-lhe a cabeça. O escravo não entendera as ações dele. A multidão também se entreolhava, atônita. Alguns comerciantes, amigos do agora defunto, vieram questionar suas razões para tal ato. Hesitaram, entretanto, quando viram o seu olhar.

“Se vocês querem manter suas cabeças no lugar, mantenham suas bocas fechadas.” Disse Darian. “Este homem furtou a água do seu dono. Furto é crime, e o escravo era propriedade dele. Este homem tinha todo o direito de tirar-lhe a vida.”

Suas palavras confundiram ainda mais as pessoas. Do meio da multidão, uma voz ecoou, protegida pelas sombras. “Por que você o matou então?”

Essa era uma pergunta complexa. Na verdade, Darian não concordava com a escravidão, e não achava que a vida de um homem devesse ser tirada só porque ele bebeu 2 litros de água. Ao mesmo tempo, não queria legitimar o furto publicamente, o que lhe levou a aplicar uma punição adequada ao ato do escravo – na verdade, poderia ter decepado-lhe a mão inteira (também poderia bem mais do que isso, se quisesse).

Assim, embora no fundo Darian tivesse matado o maltido comerciante para proteger o escravo, também o fizera por outra razão justa. “Ele desobedeceu a minha primeira ordem de largar a arma.”

O escravo, com a morte do seu senhor, ganhara a liberdade.

Ainda naquele mesmo lugar, Darian foi interpelado por seus superiores. “Bom trabalho, garoto.” Disse Cungan, o Sargento do Mosteiro. Ele era de família nobre, mas tinha poucas posses. Cungan era um homem alto e forte, com pouco cabelo, uma barba enorme e algumas cicatrizes no rosto. Também era aleijado, e por isso foi posto numa função burocrática. Usava uma muleta de madeira para compensar a falta de sua perna direita, perdida para uma fera do deserto.

“Ainda acho que você deveria ter matado o escravo. Ele roubou o homem, precisava de uma lição.” Disse o Sargento.

Darian mantinha-se olhando para baixo. Apesar de templário, não era nobre. Assim, como era de uma casta inferior, não tinha o direito de olhá-lo no olhos. “O senhor tem razão, sargento!” …o superior sempre tem razão… “eu apenas julguei na hora que a insolência do comerciante pudesse inspirar os demais.”

O sargento deixou aquilo para lá. Sabia que Darian tinha um bom coração, e que na verdade quis mesmo salvar o escravo. Mas era competente no seu trabalho. Isto era o mais importante.

O sargento passou-lhe uma missão. Deveria juntar-se à dois viajantes e encontrar uma cisterna perdida no deserto. Os planos do Rei não lhe diziam respeito, mas os rumores eram de que esta reserva d’água seria usada como recurso de um posto militar avançado. Numa guerra, este tipo de recurso era o detalhe que podia trazer uma vitória.

(continua…)